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Decisão do colegiado de 07/03/2023

Participantes

• JOÃO PEDRO BARROSO DO NASCIMENTO – PRESIDENTE (*)
• FLÁVIA MARTINS SANT'ANNA PERLINGEIRO – DIRETORA (**)
• ALEXANDRE COSTA RANGEL – DIRETOR
• OTTO EDUARDO FONSECA DE ALBUQUERQUE LOBO – DIRETOR
• JOÃO CARLOS DE ANDRADE UZÊDA ACCIOLY – DIRETOR
(**)

(*) Por estar na CVM de Brasília, participou por videoconferência.
(**) Participou por videoconferência.

PEDIDO DE AUTORIZAÇÃO DE ENTIDADE ADMINISTRADORA DE MERCADO ORGANIZADO PARA PARTICIPAÇÃO NO CAPITAL DE TERCEIROS COM PEDIDO DE DISPENSA DE REQUISITO NORMATIVO – B3 S.A. - BRASIL, BOLSA, BALCÃO – PROC. 19957.012745/2022-64

Reg. nº 2810/23
Relator: SMI

Trata-se de pedido apresentado por B3 S.A. - Brasil, Bolsa, Balcão (“B3”) solicitando (i) autorização para investimento, por meio de aquisição de cotas, em Fundo de Investimento em Participações (“FIP”) denominado L4 Venture Builder Fundo de Investimento em Participações Multiestratégia - Investimento no Exterior (“L4 VB” ou “Fundo”), no montante de até R$ 600.000.000,00 (seiscentos milhões de reais); e (ii) dispensa de autorização para realização de investimentos pelo L4 VB, com base na ressalva prevista no art. 12 da Resolução CVM nº 135/2022 (“RCVM 135”), desde que não sejam (a) investimentos superiores ao montante de R$ 100 milhões; e (b) investimentos nos quais o L4 VB tenha controle societário da investida.

Originalmente, em 08.09.2022, a B3 protocolizou pedido de dispensa de autorização para investimento, por meio de aquisição de cotas, no L4 VB, com base no art. 12 da RCVM 135.

Na oportunidade, a B3 informou que: (i) seria a única quotista do L4 VB, veículo que teria, no seu entendimento, a estrutura típica de um fundo de investimento em participações classificado como entidade de investimento, nos termos dos artigos 4º e 5º da Instrução CVM nº 579/2016; (ii) a B3 poderia designar dois dos três membros do Comitê de Investimentos do Fundo, mas não deteria participação societária direta nas investidas do L4 VB e não atuaria na administração e gestão das sociedades investidas; e (iii) o Fundo faria emissão de até 600.000 (seiscentas mil) cotas, com preço de emissão equivalente a R$ 1.000,00 (mil reais), totalizando até R$ 600.000.000,00 (seiscentos milhões de reais), contando com período de investimento de 5 (cinco) anos e de desinvestimento de 2 (dois) anos. As cotas seriam distribuídas por meio de oferta pública realizada em lote único e indivisível, somente à B3, com dispensa de registro na CVM, conforme o disposto no artigo 5º, inciso II, da então vigente Instrução CVM nº 400/2003 (dispensa também prevista na nova Resolução CVM nº 160/2022, em seu artigo 8º, inciso IV).

A B3 destacou que os investimentos do Fundo ocorreriam por meio da aquisição, pelo L4 VB, de ações, quotas, bônus de subscrição, debêntures simples e outros valores mobiliários conversíveis ou permutáveis em ações, em especial o mútuo conversível que se apresentaria como uma estrutura bastante utilizada para investimentos em empresas menos maduras. O L4 VB teria como alvos sociedades limitadas ou companhias abertas ou fechadas, sediadas no Brasil ou no exterior, e que tivessem por objeto principal o desenvolvimento de atividades conexas ou assemelhadas às da B3.

Nesse contexto, no entendimento da B3, a subscrição e integralização das cotas do L4 VB prescindiriam de autorização por parte da CVM, uma vez que o investimento no Fundo seria caracterizado como investimento financeiro nos termos do art. 12 da RCVM 135.

Ao iniciar sua análise, a Superintendência de Relações com o Mercado e Intermediários – SMI destacou seu entendimento de que o art. 12 da RCVM 135 dispensa a necessidade de concessão de autorização pela CVM para que entidades administradoras de mercado organizado adquiram participações societárias que sejam classificadas como investimentos financeiros. Ademais, a área técnica destacou sua visão de que a realização de investimentos financeiros não caracteriza o exercício de uma atividade pela entidade administradora, não se lhe aplicando, portanto, o disposto no inciso V do artigo 11 da RCVM 135.

No caso do L4 VB, a SMI solicitou a opinião técnica da Superintendência de Normas Contábeis e de Auditoria – SNC quanto à caracterização do Fundo, tendo indagado se o L4 VB, nos termos da minuta de seu regulamento, reunia as características que permitiriam classificá-lo como uma entidade de investimento, bem como os efeitos contábeis de uma eventual descaracterização do veículo como entidade de investimento.

Em resposta, a SNC, por meio do Parecer Técnico nº 10/2022/CVM/SNC/GNC, concluiu haver evidências, principalmente no regulamento do Fundo, que afastariam a qualificação do Fundo como entidade de investimento, conforme requer a Instrução CVM nº 579/2016. A SNC destacou, ainda, que, de forma material e na essência, não vislumbrara diferença entre a estrutura de investimento proposta por meio do Fundo e a realização direta dos investimentos pela B3 (existência de coligadas e/ou controladas), considerando que a influência ou o controle sobre as principais decisões estratégicas e financeiras das investidas em ambas as situações seriam detidos pela B3.

À vista dessas conclusões, a SMI solicitou que a B3 realizasse alterações no regulamento do Fundo de modo a torná-lo aderente às disposições da Instrução CVM nº 579/2016. Em seguida, a B3 apresentou nova minuta de regulamento do L4 VB com alterações nas atribuições e na composição do comitê de investimentos e na estratégia de desinvestimento do Fundo.

Em nova análise, nos termos do Parecer Técnico nº 02/2023/CVM/SNC/GNC, a SNC ressaltou que, apesar de entender que as alterações propostas pela B3 no regulamento do L4 VB trouxeram melhorias em se tratando do alinhamento ao conceito de entidade de investimento, ainda existiam aspectos que não estariam consistentes com o conceito de entidade de investimento previsto na Instrução CVM n° 579/2016, notadamente: (i) decisões da Assembleia Geral; (ii) amortizações de cotas; e (iii) liquidação do fundo.

Em síntese, a SNC entendeu haver “evidências de que o FIP L4 não se apresenta ao mercado como uma entidade de investimento, não possuindo o objetivo de fornecer investimentos para a valorização de capital no médio prazo. Pelo contrário, a estratégia de investimento do FIP L4 está atrelada a aquisição de negócios vinculados aos negócios da B3, com o objetivo de promover negócios ou produtos que não se afastem das atividades core ou assemelhadas da B3. Dessa forma, fica evidente que o interesse da B3 na estruturação do fundo vai além da valorização de capital, buscando benefícios dos investimentos nas entidades que possam ter sinergias com os atuais negócios desenvolvidos pela B3. Ademais, nos parece que esse fundo está sendo estruturado pela própria B3 e para atender aos interesses únicos dela, que é o único cotista.”.

Nesse sentido, a SNC observou que tais objetivos conflitam com o disposto no parágrafo B85B do CPC 36, segundo o qual “A definição de entidade de investimento exige que o propósito ou objetivo da entidade seja o de investir exclusivamente para valorização de capital, obtenção de receitas de investimentos (tais como dividendos, juros ou receita de aluguel) ou ambos.”. Dessa forma, não estaria configurada a hipótese de investimento financeiro defendida pela B3.

Na sequência, a B3 protocolizou correspondência por meio da qual desistiu do pedido de dispensa de autorização para subscrição das quotas do Fundo e solicitou aprovação para o investimento no L4 VB, possibilitando a subscrição e integralização de cotas do L4 VB no montante de até R$ 600 milhões. Adicionalmente, a B3 reiterou seu pedido de dispensa para realização de investimentos pelo L4 VB, mas propôs que a dispensa não se aplique aos investimentos do fundo que atendam cumulativamente aos seguintes critérios: (i) investimentos superiores ao montante de R$ 100 milhões; e (ii) investimentos nos quais o L4 VB tenha controle societário da investida. A B3 também se comprometeu a solicitar autorização prévia da CVM caso venha a realizar aportes financeiros no L4 VB que ultrapassem o montante previsto de R$ 600 milhões.

Em análise consubstanciada no Ofício Interno nº 8/2023/CVM/SMI, a SMI ressaltou que a B3 elaborou relatório de perfil de risco do investimento no Fundo L4 VB, em cuja conclusão se observa que os riscos são de nível residual baixo, considerando os aspectos financeiros, regulatórios, posicionamento estratégico e reputacional da B3, além dos processos e os controles previstos.

Dentre os riscos identificados, a SMI destacou o risco financeiro, cujo impacto pode ser extremo para a B3, embora a probabilidade de materialização tenha sido considerada baixa. O risco contempla o não atingimento dos objetivos estratégicos do L4 VB, custos para execução dos serviços prestados, e, no limite, a materialização de riscos financeiros advindos de processos judiciais. Porém, a área técnica entendeu que a perda financeira ocasionada pela desvalorização da quota do fundo é um fator de risco para o qual há diversas ações mitigatórias, dentre as quais, a diversificação da carteira e a governança do Fundo com papeis bem definidos para o comitê de investimentos, o gestor, o consultor e o administrador do Fundo.

Nesse contexto, a SMI concluiu que a autorização solicitada poderia ser concedida, considerando: (i) que os riscos da realização do investimento foram devidamente identificados e a existência de mitigadores adequados para tais riscos; e (ii) que a necessidade de obtenção de autorização prévia para a realização por intermédio do Fundo de investimentos de valores superiores a R$ 100 milhões e que lhe confiram o controle societário da investida preserva a competência da CVM de avaliar individualmente operações cujas características importem à Autarquia do ponto de vista regulatório.

Por fim, a SMI destacou a opinião emitida pela SNC nos termos do Parecer Técnico nº 02/2023/CVM/SNC/GNC, no sentido de que “independentemente da classificação do FIP L4 como entidade de investimento, a B3 continua vinculada aos procedimentos de consolidação dispostos no CPC 36, devendo avaliar se controla o FIP L4, seja o poder de controle exercido diretamente por ela ou através de um agente. Para enfatizar, mesmo que o FIP L4 fosse eventualmente classificado como uma entidade de investimento, isso não afastaria a aplicação do CPC 36 pela B3, especificamente quanto a aplicação do item 33.”.

Ante o exposto, e tendo em vista a competência específica da CVM em relação ao tema, a SMI manifestou-se favoravelmente ao pedido formulado pela B3.

O Colegiado, por unanimidade, acompanhando a manifestação da área técnica, deliberou, nos termos do disposto no art. 11, V, da Resolução CVM nº 135, conceder a autorização pleiteada.

Além de acompanhar integralmente a posição da SMI, o Diretor João Accioly registrou seu entendimento de que a regra ora aplicada não traz benefício para nenhum participante do mercado e que deveria ser eliminada em revisão normativa. Em seu entendimento, sua aplicação consome recursos da CVM em análise que já é feita pela regulada (no caso a B3) em completo alinhamento de interesses, porque a companhia precisa assegurar o satisfatório cumprimento (i) de sua atividade principal, para manter-se lucrativa, e (ii) de suas obrigações regulatórias, para evitar as consequências de descumprimento. Qualquer risco de que nova atividade pudesse prejudicar seu funcionamento já seria detectado pela própria companhia, sendo redundante a atuação estatal para o mesmo propósito; de outro lado, a eliminação da regra liberará recursos escassos da CVM para focar naquilo que os regulados não têm interesse direto ou instrumentos legais para fazer.

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